“É e nem é, mas é”. É assim mesmo, do jeito que o povo de Ipiaú gosta e quer. Chupilha, filho do decano Amâncio Felix dos Santos que viveu mais de 100 anos e gerou Zeca, Josias, Adiva e outras duas filhas, dizia em suas confabulações etílicas: ”A vida é sulfúrica, corrubirubica e cheia de malemolência”. Golava mais uma e completava: “ui,ui,ui, chega chora”! Às vezes imitava o som de um apito, temperando ainda mais o estilo satírico. Do mesmo naipe de Pedro Malasartes, Cancão de Fogo, Macunaíma, João Grilo e Chicó (estes dois da lavra do escritor Ariano Suassuna, no Auto da Compadecida), Aurenito Henrique dos Santos, o dito Chupilha, marcou época em Ipiaú. Com mestrado em presepadas, doutorado em enroladas, ele fez prevalecer a esperteza que a vida lhe deu. Habilidoso corretor de imóveis, talvez o melhor que a região já tenha visto, realizou grandes negócios, faturou polpudas comissões e as consumiu na mais escancarada esbórnia. Dizem que até vendeu terreno num cantinho do céu, alguns lotes na lua, pedras por vacas e tantas outras coisas que um livro seria pouco para narrá-las. De estatura mediana, mais pra baixo do que alto, mulato, magro, trajando impecável roupa branca e, às vezes, um terno quadriculado, usando óculos, chapéu de malandro carioca, pastinha debaixo do braço ou uma bolsa tiracolo, Chupilha era um tipo típico e ou mesmo tempo diferenciado. O apelido teve origem no antigo cabaré dos Dez Quartos, onde revelou-se exímio dançarino de gafieira e outros ritmos que o grupo musical de Erotides do Trombone tocava sob a luz vermelha da Boate Mandarim, empreendimento de Filinha, cafetina que comandava o que tinha de mais chic naquele brega.
Chupilha tinha muita semelhança física com o pastor José Sales, homem de caráter ilibado e fama de grande pregador evangélico. Certa vez, em Ubatã, alguns membros da Igreja Batista avistaram Aurenito e o confundiram com o líder religioso. De imediato formularam convite para fazer uma pregação no culto que se realizaria na noite daquele mesmo dia. O convite foi prontamente aceito e o desempenho teológico do suposto pastor obteve o reconhecimento de toda a irmandade que, em gratidão, providenciou uma coleta (a popular vaquinha) repassando-a ao sósia de José Sales. Quando a farsa foi descoberta Chupilha já estava em Ipiaú gastado a grana em atos profanos nos botecos da Rua do Sapo. Outro caso: Seu Amâncio era dono da Fazenda Oceania que também já foi de Urbano Cem Contos e hoje pertence ao empresário e ex prefeito José Mendonça. Nessa fazenda o respeitável senhor criava um boi de arrasto chamado “Mimoso”. Um dia Aurenito botou a canga no bicho e passou a realizar alguns serviços que seu Amancio pretendia. O feliz fazendeiro achou aquilo bom demais e até elogiou a iniciativa voluntaria do filho caçula. No dia seguinte, ao vistoriar o rebanho, seu Amâncio deu por falta de “Mimoso”. Após rápida investigação ficou sabendo que o animal tinha sido arrastado com canga e tudo para o matadouro e a sua carne já estava em algum açougue da Praça da Feira. Falando de carne contaram-me que Chupilha tinha dentre seus vizinhos mais próximos um casal cuja libido era um tanto escandalosa. Parede e meia ele ficava ouvindo aqueles ruídos da luxuria. Não durou muito tempo esse batente, pois o casal mudou de endereço e Chupilha ficou na mão. Algum tempo depois encontrou o ex-vizinho e foi logo reclamando: ”Que falta vocês estão fazendo naquela rua. Era aquela chiadeira, aquele ui ui ui, que me estimulavam a ter prazer!