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Consultor fala sobre condutas vedadas aos agentes públicos nas eleições

Dr. Moiséis Brito (Foto: Divulgação)

Em um ano eleitoral são muitas os questionamento e  demandas que envolvem candidatos, gestores e servidores públicos, em especial por conta do suposto  uso indevido da máquina pública na maioria dos municípios brasileiros. Para comentar sobre o assunto, como sempre, recorremos ao Dr. Moiséis Rocha Brito, consagrado e conceituado consultor e assessor em administração pública há mais de trinta e cinco anos na região, advogado, administrador, professor, teólogo, pós-graduado em direito público – controladoria interna, em metodologia do ensino superior, em direito previdenciário, em processo civil, presidente do IBAP – Instituto Baiano de Administração Publica e membro da ABOP – Associação Brasileira de Orçamento Público  etc., que, assim explanou:

Condutas Vedadas aos Agentes Públicos nas Eleições  (Lei 9.504/1997)

O processo eleitoral traz por meio da Lei 9.504/1997 diversas condutas vedadas aos agentes públicos, condutas estas, se não observadas, tenderá a afetar a isonomia e a igualdade de oportunidades entre os candidatos no pleito eleitoral, gerando total desequilíbrio na condução do processo, além de proporcionar o abuso de autoridade, do poder político e econômico por parte daquele que detém o Poder.

No meu entendimento essa tendência desequilibrada já é implícita de forma geral, quando da permissibilidade da disputa à reeleição sem o devido afastamento do candidato à frente da administração pública. É nítida a desproporcionalidade em relação a quem está com o domínio da máquina, para quem não dispõe dessa realidade. A legislação existe justamente para coibir qualquer tipo infração a ser praticada pelos agentes públicos que dispõe da máquina pública, em especial na execução e operacionalização das condutas vedadas pela lei, que de certa forma termina por beneficiar a si ou a terceiros no processo eleitoral.

Destaque das Principais Condutas Vedadas aos Agentes Públicos nas Eleições de Acordo Perguntas Frequentes

1 – O que é considerado agente público para fins eleitorais?

De acordo com § 1º do art. 73 da Lei nº 9.504, de 1997, reputa-se agente público, para os efeitos deste artigo, quem exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nos órgãos ou entidades da administração pública direta, indireta ou fundacional.

2 – Quais são as principais condutas vedadas aos agentes públicos em período eleitoral?

São vedadas condutas como uso de recursos públicos para favorecer candidaturas, comparecimento em inaugurações de obras públicas como candidatos, distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios, uso de publicidade institucional para promoção pessoal, aumento de gastos públicos com publicidade acima da média dos últimos três anos anteriores ao da eleição, dentre outras.

3 – Um agente público pode participar de campanhas eleitorais?

Sim. Os agentes públicos, como todos os cidadãos, podem participar de campanhas eleitorais, desde que seja fora do horário de trabalho e não haja uso de recursos públicos, garantindo assim a observância dos limites impostos pela legislação e os princípios éticos que regem a Administração Pública. A participação inclusive pode ser feita quando o servidor encontrar-se em período de gozo de férias ou em licença.

4 – É permitida a propaganda eleitoral em sites de órgãos públicos?

Não. A lei proíbe expressamente a realização de propaganda eleitoral em sites oficiais ou em páginas hospedados por órgãos ou entidades da administração pública direta ou indireta.

5 – Quais são as penalidades para as condutas vedadas praticadas por agentes públicos?

O descumprimento das normas eleitorais sujeita o agente público a diversas penalidades, inclusive responsabilização criminal. Em alguns casos, a sanção limita-se à fixação de multa pecuniária, em valor gradativo a depender da gravidade da infração, mas também pode resultar na cassação do registro ou diploma do candidato ou caracterizar, ainda, ato de improbidade administrativa, acarretando a aplicação das penalidades previstas na Lei nº 8.429/92, ou até mesmo inelegibilidade para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos subsequentes à eleição em que ocorreu a infração

6 – Existem exceções para a distribuição de bens, valores ou benefícios por agentes públicos durante o período eleitoral?

Sim. A distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios é permitida apenas em casos de programas sociais autorizados por lei, já em execução orçamentária, além de situações de emergência e calamidade pública.

7 – Um agente público pode ser responsabilizado por atos praticados antes do período eleitoral?

Sim. Condutas praticadas mesmo antes do período eleitoral podem ser consideradas abusivas ou em desacordo com as normas eleitorais.

8 – Como deve ser a postura dos agentes públicos em relação à veiculação e ao combate de notícias falsas durante o período eleitoral?

Os agentes públicos não devem veicular ou contribuir para a disseminação de notícias falsas, destacando-se a importância de manter o compromisso com a verdade e a precisão das informações, especialmente durante o período eleitoral.

9 – Como é a regulamentação sobre a contratação de shows artísticos por agentes públicos durante o período eleitoral?

Durante o período eleitoral, os agentes públicos são proibidos de contratar shows artísticos, financiados com recursos públicos, para a promoção de candidatos, partidos políticos ou coligações. Esta proibição visa assegurar a igualdade de condições na competição eleitoral e prevenir o abuso do poder econômico e político. Enfatiza-se a importância de manter a neutralidade dos recursos públicos em atividades que podem influenciar diretamente o pleito eleitoral, como eventos de grande abrangência popular que incluem apresentações artísticas.

10 – Pode haver cessão de servidores públicos para comitês de campanha eleitoral de candidato?

Não. É proibido ceder servidor público ou empregado da administração direta ou indireta federal, estadual ou municipal, do Poder Executivo. Também é proibido usar os serviços dos agentes públicos para comitês de campanha eleitoral de candidato, partido político ou coligação e federação, durante o horário de expediente normal, exceto se servidor ou empregado estiver licenciado (cf. art. 73, inciso III, da Lei nº 9.504, de 1997, e Resolução TSE nº 23.735, de 27 de fevereiro de 2024).

11 – Pode o servidor público comparecer à repartição fazendo uso de vestimenta, adesivos ou broches que identifiquem candidatos ou possuam natureza eleitoral?

Não. É terminantemente proibido ao servidor público, inclusive ao estadual, o uso de materiais publicitários ou de natureza eleitoral que representem propaganda de candidato ou partido político no âmbito das repartições públicas. Tal vedação abrange o uso de adesivos, broches, bottons, etc., inclusive em bens e materiais no recinto de trabalho.

12 – A proibição de utilização de material político no âmbito da repartição pública abrange o usuário dos serviços públicos?

Não. A vedação abrange tão somente o servidor público, devendo ser coibida, inclusive, qualquer espécie de manifestação, no âmbito das repartições públicas estaduais, que possa ter conotação eleitoral.

13 – Há alguma restrição para o uso de e-mails oficiais pelos servidores públicos?

Sim. Esse veículo de comunicação deve ser utilizado apenas para fins institucionais, não devendo ser utilizado para divulgação de material de campanha eleitoral, ou para qualquer finalidade correlata.

14 – É proibida propaganda institucional e a utilização de símbolos, marcas, imagens e expressões que identifiquem determinado governo nos três meses que antecedem o pleito?

Sim. É proibido a propaganda institucional nos três meses que antecedem ao pleito, ou seja a partir de 06/07/2024, bem como veiculação e publicação que contenha slogans, símbolos, cores ou logotipos da gestão. Não se enquadra nesse caso o uso de símbolos oficiais a exemplo do brasão e da bandeira. As notícias veiculadas antes do período eleitoral podem ser mantidos em área sem destaque e devidamente datados, para que se possa comprovar junto à Justiça Eleitoral o período de sua veiculação (REspe nº. 29387, Acordão de 21/11/2027).

Não estão proibidas nesse período as publicações eminentemente de caráter informativo institucional (ex.: divulgação de datas e locais para vacinação, matriculas escolares, mudança de trafego etc.), portal da transparência do município, publicação dos atos administrativos. Para evitar deturpações na publicidade institucional, historicamente enraizadas na Administração Pública, o § 7º do art. 37 dispôs que “a publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos”. A partir de 06/07/2024 a propaganda institucional está proibida, ressalvadas as raras exceções aqui expostas, bem como o aumento de gastos com propagandas no ano eleitoral, levando em consideração a média dos últimos três anos.

15 – Quem está abrangido pela proibição de inauguração de obras públicas em período eleitoral?

É proibido a qualquer candidato comparecer, a partir de 06 de julho de 2024, a inaugurações de obras públicas (Lei nº. 9.504/97, art. 77, caput).

16 – A proibição de inauguração de obras públicas abrange o ato de visita a obras já inauguradas ou em execução?

Não, desde que a visita ou inspeção de obras se dê em caráter administrativo, pois segundo entendimento do TSE, o candidato a cargo do Poder Executivo que visita obra já inaugurada não ofende a proibição contida no artigo 77 da Lei Federal nº. 9.504/97.

17 – Quais as restrições em relação à participação em programas e pronunciamentos em rádio e TV, por parte dos servidores públicos?

Os pronunciamentos dos servidores públicos, no exercício de suas atribuições institucionais, devem se restringir tão somente a questões de natureza administrativa, estando vedada qualquer espécie de menção a questões eleitorais.

18 – A administração pública pode continuar a promover os seus programas, eventos, palestras, cursos e treinamentos, ou seja, eventos – de maneira geral – durante o período eleitoral?

Sim. Não há vedação expressa quanto à realização desses eventos, tendo em vista que se deve garantir a continuidade do serviço público, mesmo durante o período eleitoral, justamente para não causar prejuízos à população. No entanto, é de suma importância que esses eventos não tenham nenhuma conotação político partidária, nem favoreçam esse ou aquele candidato participante do pleito eleitoral, sob pena de ser considerada ilegal. Recomenda-se, buscando dar transparência e demonstração de boa-fé, que seja oficiado ao Ministério Público Eleitoral dando-lhe conhecimento sobre a realização do evento a fim de que possa, em querendo, fiscalizá-lo.

19 – O agente público pode ser penalizado por improbidade administrativa em função da prática de determinada conduta vedada no ano eleitoral?

A Constituição Federal, no art. 37, § 4º, estabeleceu as sanções para os casos de improbidade administrativa, objetivando conferir proteção à moralidade e à probidade no trato com a coisa pública. Por sua vez, a Lei Federal nº 8.429, de 1992 (Lei de Improbidade Administrativa – LIA) tipifica as condutas que importam enriquecimento ilícito (art. 9º), que causam dano ao erário (art. 10) e, ainda, que violem os princípios da Administração Pública (art. 11), bem como regulamenta o dispositivo constitucional acima retratado, instituindo as sanções cabíveis de acordo com a conduta praticada. A Lei Federal nº 14.230, de 2021, promoveu diversas alterações nas disposições acerca da Lei de Improbidade Administrativa, revogando o inciso I, do art. 11. Todavia, a revogação do art. 11, inc. I, da Lei nº 8.429, de 1992, pela Lei nº 14.230, de 2021, não impede o eventual enquadramento das condutas vedadas pela Lei nº 9.504, de 1997, em algum dos tipos enunciados nos arts. 9º, 10 e 11 da Lei nº 8.429, de 1992. Nesses casos, a competência para processar e julgar o ato de improbidade não será da Justiça Eleitoral, mas da Justiça Comum. As penalidades também não são de ordem eleitoral, mas de ordem cível-administrativa àquele que venha a ser condenado.

20 – Como agente público posso manifestar minhas preferências político-eleitorais nas minhas contas junto as redes sociais?

Sim, desde que fora do horário de trabalho, sem uso de recursos do município e sem qualquer tipo de associação entre o conteúdo da publicação e o cargo, emprego, função ou quaisquer outros vínculos existentes entre você e a administração pública municipal.

21 – Como agente público posso gravar ou transmitir vídeos de apoio a candidato de dentro da minha unidade de trabalho?

Não, pois há nítido conflito de interesses entre a atividade político-eleitoral e as atribuições funcionais.

22 – O poder público pode manter placas de obras públicas que foram colocadas antes dos três meses que antecedem as eleições?

Não. O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) entende que a publicidade institucional não pode ser mantida no período vedado, sendo irrelevante o momento de autorização ou afixação da peça publicitária, com destaque proibitivo aquelas que contêm slogans, símbolos, cores ou logotipos da gestão. Podendo permanecer aquelas que dispõe tão somente de informações institucionais a exemplo: o valor da obra, a especificação da licitação, o prazo de execução da obra etc.

23 – Posso usar aparelhos (telefones, celulares, computadores, máquinas reprográficas, etc…) de órgãos e entidades da administração pública municipal em atividades político-eleitorais?

Não. É vedada a utilização de bens da administração pública em benefício de candidato, partido político, coligação ou federação partidária.

24 – Pode haver contratação e exoneração de servidores no período eleitoral para a administração publica municipal?

É proibido nomear, contratar ou de qualquer forma admitir, demitir sem justa causa, suprimir ou readaptar vantagens ou por outros meios dificultar ou impedir o exercício funcional e, ainda, ex officio, remover, transferir ou exonerar servidor público, na circunscrição do pleito, nos três meses que o antecedem até a posse dos eleitos, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvados a nomeação ou exoneração de cargos em comissão e designação ou dispensa de funções de confiança; a nomeação dos aprovados em concursos públicos homologados antes de 06/07/2024; a nomeação ou contratação necessária à instalação ou ao funcionamento inadiável de serviços públicos essenciais (no caso fortuito ou de força maior – ex. surto de dengue, cólera, situação e estado de emergência etc.).

25 – Procurador municipal pode atuar como advogado de candidato, partido ou federação?

Depende do regime de contratação do servidor. Se o procurador tem regime de dedicação exclusiva, não pode atuar como advogado mesmo fora do horário de expediente. Já se seu regime de contratação não prevê a dedicação exclusiva, pode atuar, desde que licenciado ou fora do horário de expediente.  (Ac. de 28.6.2018 no AgR-AI nº 69714, rel. Min. Admar Gonzaga)

26 – A devolução de valores de despesas decorrentes do uso ou cessão do bem público por parte do agente publico é suficiente para descaracterizar a conduta vedada?

Não. Conforme entendimento pacificado do TSE, é irrelevante o ressarcimento das despesas, para descaracterização das condutas vedadas. (TSE, Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 25770, Rel. Min. Antonio Cezar Peluso, DJE 21.03.2007).

27 –  Pode ser demitido o servidor contratado temporário, ter suspenso ou renovado seu contrato no período eleitoral?

Ao tratar sobre a demissão de servidores temporários, decidiu o Tribunal Superior Eleitoral que “a contratação e demissão de servidores temporários constitui, em regra, ato lícito permitido ao administrador público, mas que a lei eleitoral torna proibido, nos três meses que antecedem a eleição até a posse dos eleitos, a fim de evitar qualquer tentativa de manipulação de eleitores”. (AgR-REspe nº 65256, Acórdão de 1º.3.2018). Por analogia entende-se que a suspensão do contrato ou sua renovação no período vedado fere as disposições da Lei 9.504/1997.

28 – A administração publica pode aumentar o gasto com despesa de pessoal nos 180 (cento e oitenta) dias que antecede o fim do mandato?

Não. De acordo o art. 21, II da Lei Complementar nº. 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF) é nulo de pleno direito o ato de que resulte aumento da despesa com pessoal nos 180 (cento e oitenta) dias anteriores ao final do mandato do Prefeito Municipal.

29 – O servidor com pedido de afastamento deferido para concorrer as eleições, com o objetivo meramente formal, poderá eventualmente responder e devolver recursos públicos pagos no período do afastamento?

Sim. A administração municipal deverá subordinar a continuidade do afastamento do servidor à prova, a posteriori, da homologação de sua candidatura, mediante apresentação de toda a documentação necessária à comprovação desta condição, sob pena de apuração administrativa. As candidaturas de servidores públicos, com fruição de licença remunerada, sem o correspondente intento de engajarem-se em campanhas, o que pode se constatar quando há despesas eleitorais inexistentes ou irrisórias e votação ínfima, são consideradas fraudulentas (meramente formais), e atentam contra o princípio da moralidade e dos deveres de lealdade e honestidade à administração pública, configurando-se, em tese, ato de improbidade administrativa (Lei n° 8.429/92) e crime de estelionato majorado (art. 171, §3°, do Código Penal).

30 – Contratação de pessoal anormal por parte da administração municipal mesmo antes do período de 3 (três meses) do pleito eleitoral, poderá ensejar irregularidade à Lei 9.504/1997?

Existe vários decisórios do Tribunal Superior Eleitoral – TSE, dispondo que mesmo que as contratações a qualquer titulo e forma, tenham ocorrido antes do prazo de três meses que antecede o pleito, a que se refere o art. 73, V, da Lei das Eleições (Lei 9.504/1997), tal alegação não exclui a possibilidade de exame da ilicitude para fins de configuração do abuso do poder político, especialmente porque se registrou que não havia prova de que as contratações ocorreram por motivo relevante ou urgente, em especial quando não figurou qualquer aumento de serviços públicos, considerando o que anteriormente vinha sendo desenvolvido. (Ac. de 5.9.2019 no AgR-AI nº 18912, rel. Min. Tarcísio Vieira de Carvalho Neto).