Em tempo de Copa do Mundo do Futebol Feminino, vale relembrar uma equipe precursora desta modalidade esportiva em Ipiaú. O time surgiu na década de 1970, período em que inúmeros países suspenderam as proibições do futebol feminino. Muitas mulheres ipiauenses já batiam seus babas, mostravam habilidade com a bola e chamavam a atenção dos desportistas locais.
No ano de 1979 entrava em campo “As Panteras”, nome inspirado na série televisiva homônima. O emblema na camiseta vermelha trazia a imagem do personagem Pantera Cor de Rosa criado pelos estúdios DePatie-Freleng Enterprises.
A equipe foi idealizada pelo mestre de obras Nelson Macedo que na condição de vice-presidente da Liga Desportiva Rionovense, tentava resolver a ausência de público no Estádio Pedro Caetano.
Os jogos femininos aconteciam na preliminar dos masculinos que disputavam o campeonato municipal. Não demorou muito para que o poderio dos homens fosse ameaçado. As empoderadas atletas tornaram-se as principais atrações do futebol ipiauense.
Ganharam fama intermunicipal, aceitaram desafios em diversas cidades da Bahia, inclusive em Salvador, aplicaram goleadas, superaram armações, discriminações, sentiram-se vitoriosas. Quando jogava em casa, a moçada atraia um público três vezes maior que os jogos dos homens.
O time manteve longa invencibilidade, inclusive contra equipes masculinas. As meninas davam show enquanto os marmanjos lamentavam, protestavam em preconceitos. Afloravam o machismo, mas, sem outro jeito, aceitavam a concorrência.
Mudanças começavam a ganhar força, revoluções nos costumes, ideias mais tolerantes. Em sua primeira formação o time das Panteras tinha em sua maioria atletas residentes em Ipiaú. Dentre elas destacavam-se Zete, Adélia, Adalita, Ana Periquita, Ana Preta, Ana Bela, Nai e Nega.
Elas iniciaram nos babas do areião do rio de Contas ao fundo da Praça dos Cometas, e tinha como treinador o atleta Zé Sansão. Depois vieram Bogí e Fernando Castro.
À proporção que o time participava de competições mais importantes a diretoria buscava novas jogadoras em outras cidades. Nessa ocasião a equipe foi filiada à Federação Baiana de Futebol (FBF).
Dentre os reforços veio de Jequié a fenomenal Sueli, atacante que tinha condições de jogar em qualquer equipe profissional do futebol feminino. Driblava com extrema habilidade, dava assistências precisas, fazia muitos gols, arrancava aplausos da torcida.
Depois chegaram Diana, Vera, Neidinha, Joelia, Lucia (de Ubatã ), Meire (de Itabuna), Niza, Bel e outras jogadoras de cidades mais próximas. Formava-se uma verdadeira seleção do sul e sudoeste baiano.
A maior goleada aplicada pelas Panteras foi 20 X 0 sobre um time da cidade de Ituberá. Outras goleadas aconteceram no decorrer dos primeiros anos da década de 1980.
Jogando em Salvador, o time de Ipiaú empatou com a forte do aristocrático Clube Baiano de Tênis. No Estádio Pedro Caetano teve bons resultados contra o Ipiranga, de Salvador e a Catuense.
Em Feira de Santana foi vítima de uma sabotagem: antes do jogo contra o Flamengo de Feira, colocaram laxante na comida das panteras.
A dor de barriga não impediu uma boa apresentação, mesmo tendo no time adversário nada menos que a lendária Sissi, maior nome do futebol feminino brasileiro antes de Marta.
Muitas vezes o bom futebol das Panteras motivava reações violentas das equipes e torcidas adversárias. Tinha jogo que nem chegava a terminar. O tempo fechava, o pau quebrava, todo mundo saia na mão.
Em Coaraci, Itabuna e Simões Filho, o elenco ipiauense deixou o estádio escoltado pela polícia dessas localidades.
A atacante Ana Bela que atuava pela ponta direita, considera que a melhor formação das Panteras foi em 1984 e esteve assim constituída: Lucia, Joélia, Nen Rocha, Ana Periquita, Neidinha. Ana Preta, Diana, Guga. Ana Bela, Sueli e Maristela.
“Era fantástico esse time. Show de bola mesmo”, afirma Bela. Ela acrescenta que se fosse hoje, algumas das jogadoras do time dirigido por Nelson Macêdo chegaria à Seleção Brasileira.
A burocracia venceu As Panteras. Quando a equipe estava no auge, dirigentes da Liga Desportiva resolveram não mais liberar o Estádio Municipal para os treinamentos.
Nelson Macedo buscou de todas as maneiras contornar o problema, mas nada pode fazer. Inconformado, ele decidiu tirar o time de campo. Ipiaú perdeu. A torcida lamenta desde então.
A história do futebol feminino na Bahia tem um capitulo escrito pelo clube fundado pelo mestre de obras que também ajudou a construir Brasília. Nelson se diz honrado pelo trabalho que desenvolveu em favor do futebol feminino, através das revolucionárias Panteras. *José Américo / GIRO IPIAÚ