Giro Ipiaú

Folclore: Relembre o caso do lobisomem que assustou Ipiaú

*Por José Américo Castro

Era no tempo do “orelhão”, quando alguém, com um cartão de unidades quase esgotadas, ligou para o programa Panorama 91, da rádio Ipiaú FM, e com voz nervosa revelou: – Eu vi um lobisomem no Bairro Novo! Foi tudo que o radialista Celso Rommel precisava pra fazer o escarcéu . No afã de aumentar a audiência ele caprichou no sensacionalismo: – “Vixe Maria, era só o que faltava em Ipiaú”.

O depoente contou que em um beco, no bairro Euclides Neto, por volta da meia-noite, ao brilho da lua cheia, avistou um bicho preto, peludo como um urso, acocorado, emitindo uivos e gemidos abafados. Disse ainda não ter dúvida de que era um lobisomem. Celso instigou: – Como é que é rapaz? O interlocutor respondeu: – É isso mermo véi. Eu vi um lobisomem!

Antes que a última unidade do cartão esgotasse, o informante detalhou: – “Ele tava cagando e depois foi embora. A bosta era igual a de cachorro”. O radialista não perdeu tempo: – Vocês ouviram? O cidadão disse que tem um lobisomem no Bairro Novo. No dia seguinte, na abertura do programa, Celso Rommel, com seu vozeirão habitual, escancarou a manchete: “ Lobisomem assusta moradores da Avenida Pensilvânia“.

O telefone da rádio não parou mais de tocar. Muita gente garantindo ter visto a estranha criatura ligava pra emissora informando:

“Ele comeu a galinha da minha vizinha”; “Matou os porcos do chiqueiro de seu Antônio; “Estraçalhou um cachorro de João Guarda”; “Mijou na porta da Igreja de São José Operário”; “Surpreendeu um grupo de evangélicos e foi repreendido em nome de Jesus”.

Com o assunto em alta, Celso Rommel prosseguiu provocando outros depoimentos. A audiência crescendo, atingindo o pico, recordes de feedback, o radialista botando pilha, atiçando o imaginário em uma sucessão de manchetes:

“LOBISOMEM INFERNIZA CANTINHO DO CÉU”.

“COMUNIDADE DA RUA DOUTOR PREVENILDO SE ARMA PARA COMBATER A FERA.”

“BICHO FOI VISTO VAGANDO NO CAGA LONGE”.

“POPULAÇÃO DO MÁ RAPADO PEDE SOCORRO”.

“RUA DA BANCA, BURACO DA GIA E MORRE SEM VELA, EM ESTADO DE ALERTA”.

Uivos, em efeitos sonoros, garantiam mais sucesso às manchetes. A farra do lobisomem prolongou-se por quase um mês. Muita gente jurando ter visto a fera. Depois de algumas noites zoando no Sitio do Picapau, o cachorrão resolveu extrapolar limites geográficos. Foi dançar em riba da ponte do Japomerim, fuçar no ACM, barbarizar na Vila Cupim, chocar na Rua da Granja, aprontar no Passa com Jeito, curtir a cidade inteira.

Chegaram a organizar uma força tarefa para caçar o bicho. Heróis de plantão, membros da Guarda Municipal, vaqueiros, tropeiros, seguranças de firmas, voluntários de todo calibre se colocaram à disposição. Até o valente João Farangoso, com sua patente de soldado improvisado, se colocou nas fileiras.

A produção do Panorama 91, solicitou que a direção da Ipiaú FM deslocou uma equipe de reportagem para acompanhar a ação da captura do lobisomem. A escolha recaiu sobre os trepidantes Digue Moral e Tonhe Encrenca. Por mais campana que fizessem nenhum êxito lograram. Não contavam com a astúcia da fera. O zignal foi geral.

À beira da paranoia, o povo começou a procurar bodes expiatórios. Qualquer pobre coitado com aspecto amarelado, cabelos e barba em desalinho, unhas grandes e sujas, olhos fundos de insônia, ficava sob suspeita. Lhe prometiam surras de cruvelana, panadas de facão, implacáveis perseguições.

Um dia, João Kleber, inveterado playboy municipal, ligou para o programa e disse: “Identifiquei o sujeito que vira lobisomem! Em seguida descreveu: “Ele é uma autoridade, transita num carrão preto, de luxo, usa terno e gravata e carrega uma cartela de Gardenal no bolso”. O assunto ganhou outra conotação, foi envultando no inconsciente coletivo, transmutando-se em piadas… Até hoje o caso do Lobisomem do Bairro Novo é lembrado com muitas gargalhadas. As conclusões ficam com os senhores, caros leitores. *Por José Américo Castro