Bem que seu Amâncio e dona Joana procuraram criar Aurenito no bom caminho. Fizeram-no freqüentar a Igreja Batista, ouvir as pregações do pastor Abílio e ler a Bíblia todos os dias, além de providenciarem seu ingresso no internato do Colégio Taylor Egidio, em Jaquaquara. No entanto, nem os conselhos paternos, nem a doutrina cristã e muito menos o exemplo de probidade e honradez do professor Carlos Dubois, “o lapidador de homens”, deram jeito no rapaz. Proveitosas mesmo foram as aulas extracurriculares da professora Stela Câmera (musicista e teatróloga) “que faziam o Taylor Egidio cantar, sonhar e sorrir”.
Os belíssimos corais e peças teatrais marcaram a vida dos alunos, tornando o estabelecimento uma experiência inesquecível. Foi nessa pegada artística que Chupilha aperfeiçoou seus dotes de ator e descobriu o talento de tocador de gaita que exibia nas incontáveis farras e servia de trilha sonora ao extenso repertorio de piadas. Cômico, dramático, Chupilha escreveu em linhas tortas o que considerava certo, mesmo sabendo que “malandro demais se atrapalha”. Seus causos ainda são lembrados, contados e até estudados. Vamos a eles.
Chupilha tinha muita semelhança física com o pastor José Sales, homem de caráter ilibado e fama de grande pregador evangélico. Certa vez, em Ubatã, alguns membros da Igreja Batista avistaram Aurenito e o confundiram com o líder religioso. De imediato formularam convite para fazer uma pregação no culto que se realizaria na noite daquele mesmo dia. O convite foi prontamente aceito e o desempenho teológico do suposto pastor obteve o reconhecimento de toda a irmandade que, em gratidão, providenciou uma coleta (a popular vaquinha) repassando-a ao sósia de José Sales.
Quando a farsa foi descoberta Chupilha já estava em Ipiaú gastado a grana em atos profanos nos botecos da Rua do Sapo. Outro caso: Seu Amâncio era dono da Fazenda Oceania que também já foi de Urbano Cem Contos e hoje pertence ao empresário e ex prefeito José Mendonça. Nessa fazenda o respeitável senhor criava um boi de arrasto chamado “Mimoso”.
Um dia Aurenito botou a canga no bicho e passou a realizar alguns serviços que seu Amancio pretendia. O feliz fazendeiro achou aquilo bom demais e até elogiou a iniciativa voluntaria do filho caçula. No dia seguinte, ao vistoriar o rebanho, seu Amâncio deu por falta de “Mimoso”. Após rápida investigação ficou sabendo que o animal tinha sido arrastado com canga e tudo para o matadouro e a sua carne já estava em algum açougue da Praça da Feira.
Falando de carne contaram-me que Chupilha tinha dentre seus vizinhos mais próximos um casal cuja libido era um tanto escandalosa. Parede e meia ele ficava ouvindo aqueles ruídos da luxuria. Não durou muito tempo esse batente, pois o casal mudou de endereço e Chupilha ficou na mão. Algum tempo depois encontrou o ex-vizinho e foi logo reclamando: ”Que falta vocês estão fazendo naquela rua. Era aquela chiadeira, aquele ui ui ui, que me estimulavam a ter prazer!
A extraordinária competência de Chupilha como corretor de imóveis permitiu que ele vendesse um mesmo terreno a oito clientes diferentes. É da sua autoria o nome de “Má Rapado”, dado a uma rua da periferia de Ipiaú. Nesse local ele vendia alguns lotes para habitações populares e buscando melhorias para a área solicitou ao prefeito Zequinha Borges que ali realizasse um serviço de terraplanagem. O pleito foi atendido, mas sem o devido esmero. Ao constatar o armengue administrativo, Chupilha, cheio de espirituosidade, definiu: “ta má rapado igual aos pentelhos dele”. Com tanta artimanha Aurenito não poderia ficar fora da política ipiauense.
Candidato a vereador, participava de um comício na Rua do Cruzeiro quando no auge da emoção foi dizendo em seu discurso: “Vejo esse povo e fico tão emocionado que até sinto arrepios nos cabelos… ” Antes de completar a frase, um gaiato, ao pé do palanque, gritou:- do c… Sem perda de tempo Chupilha retrucou:” da tua mãe f.d.p! Em mais outro caso, dizem que ao entardecer de certo dia alguém procurou o famoso corretor com o intuito de comprar, às pressas, tipo “urgência urgentíssima”, uma fazenda de gado. Horas depois, sob o clarão da lua cheia, estava Chupilha e o pretenso pecuarista num mirante admirando uma baixada cheia de rezes branca.
Entusiasmo com a visão o precipitado cliente fez questão de efetuar a transação naquela mesma noite. Na manhã seguinte a escritura do imóvel foi lavrada em cartório. À tarde, o comprador resolveu verificar de perto a sua nova propriedade e chegando lá constatou que ao invés de gado no pasto tinha era muita pedra pintada de cal. Enorme era a capacidade de Chupilha em ser querido. Até mesmo suas vitimas mais prejudicadas não conseguiam odiá-lo.Um Sete Um” de verdade é assim mesmo! Nem sempre o pau que nasce torto morre torto.
Quando a necessidade exige ele se alinha e fica no prumo. Chupilha mudou de vida, sossegou. Hoje mora em São Paulo, tem o aconchego da família, filhos que lhe acolheram e amam com intensidade. Religou-se à doutrina cristã, voltou aos estudos teológicos. Sentado no trono de um apartamento, assiste televisão, toca violão, ler o “Estadão” e outros jornais de Sampa. Curte a garoa e vive numa boa. Quando lembra de Ipiaú: “ui ui ui, chega chora”! (Giro/José Américo Castro).