Ele foi exemplo de superação e competência profissional. A poliomielite lhe deixou paraplégico aos dois anos, mas não deteve a sua caminhada na vida. Movimentou-se como pôde na busca dos objetivos e encontrou na oratória a principal razão da sua história.
Nascido em Ilhéus, no dia 06 de junho de 1935, recebeu dos seus pais, Manoel Nonato e Egle Amaral, o nome de José Marques Amaral, porém ficou mais conhecido como “Zezito”. As cidades de Ubaitaba, Ubatã, Brasília e Ipiaú estiveram em seu caminho e ecoaram a potencia da sua voz, testemunharam o exercício da sua cidadania.
Zezito Amaral gerou três filhas (Nara, Sara e Jussiara), cultivou muitas amizades, formou discípulos, lutou pelos direitos dos deficientes físicos, tornou-se um grande desportista. Também se deu à boemia, conviveu com artistas, freqüentou cabarés, curtiu farras homéricas. Seu nome jamais será esquecido por aqueles que lhe conheceram e cultivam o sentimento da gratidão.
Ainda criança, aos dez anos de idade tornou-se morador de Ubaitaba. Para que isso acontecesse teve que viajar num trem de ferro, de Ilhéus até Aurelino Leal, e atravessar de canoa o Rio das Contas. A antiga Itapira lhe traria novas perspectivas de vida. Ali desfrutou os melhores momentos da infância: ingressou na escola da professora Alice de Magalhães, ganhou a primeira cadeira de rodas, doada por Petrônio Amorim, gerente da firma Correia Ribeiro, assistiu os primeiros filmes no Cine Lux, conseguiu o primeiro emprego, como auxiliar do agente de seguros Clodoaldo Santana (Coló), e também a oportunidade de falar pela primeira vez em um microfone. A “canja” foi proporcionada pelo locutor Raimundo, do Parque Estrela do Norte, cujo dono, Ângelo Nunes (“Mestre Anjo”) inauguraria, tempos depois , o famoso Parque Ouro Verde. Os venturosos dias da adolescência de Zezito também foram vivenciados em Ubaitaba.
O Serviço Social e Propagandista de Ubaitaba ficou desfalcado do locutor José Bessa Leite, baleado durante uma briga no cabaré de Deon, em Poirí (atual Aurelino Leal). Foi então que o jovem Zezito teve a chance de começar a exercer a profissão que tanto sonhava. De imediato provou seu talento criando uma programação diferente, com sessões de esporte, cultura, religião e noticiais em geral. É nesse período que estabelece amizade com o cantor e compositor Fernando Lona que se tornaria um ícone da cultura nacional a partir da conquista do primeiro lugar no Festival Nacional de Música Popular da TV Excelsior (SP) com a marcha rancho “Porta Estandarte”, em parceria com Geraldo Vandré. Entusiasta do futebol, Zezito Amaral engajou na diretoria do Grêmio Esportivo Almirante Barroso, o time dos canoeiros de Itapira, cujo maior rival era o Palmeiras de Poirí. Sua constante dinâmica permitiria realizar inúmeras outras façanhas na “Cidade das Canoas”.
Em março de 1958, Sandoval Alcântara, prefeito do recém emancipado município de Ubatã (antigo Dois irmãos), oferece boa proposta para Zezito assumir o serviço de alto falante desta cidade que então vivia a euforia da construção da Usina do Funil. Mais de mil homens trabalhavam na obra e muito dinheiro circulava no município. Gente de todos os quadrantes chegava até ali. Só de prostitutas eram cerca de 800, conforme atestou uma pesquisa feita, na época, pela Prefeitura Municipal e registrou o próprio Zezito num esboço da sua autobiografia. A Boate Copacabana era o ponto chic daquele momento de efervescência.
Zezito Amaral tornou-se muito querido em Ubatã. Estimulado pelo crescente carisma ele resolveu, no ano de 1962, ingressar na política local, buscando uma vaga na Câmara de Vereadores, pelo PTB. Os votos recebidos foram suficientes para lhe garantir uma suplência, entretanto em algumas ocasiões chegou a assumir, interinamente, a vaga do titular. O espírito desportista de Zezito também se manifestaria em Ubatã, onde junta-se a Androsil Silva, Geraldo Bahiana Machado, dentre outros cidadãos, para tornar o Botafogo um clube de muitos títulos. Em 1963 o Rio de Contas transbordou causando estragos nas cidades ribeirinhas, principalmente em Ubatã que foi parcialmente destruída pela grande enchente. Zezito compreendeu que era tempo de buscar novos rumos.
O sonho por melhores dias lhe conduziu até Brasília, onde se pagava o melhor salário do país. A longa viagem, em um caminhão pau de arara, durou cinco dias. Chegando ao Distrito Federal, Zezito Amaral busca contato com Waldir Pires, Consultor Geral da República, gente grande no governo do Presidente João Gulart (Jango), e consegue emprego na Rádio Educadora, órgão vinculado ao Ministério da Educação. Aconteceu, naquele conturbado ano de 1964, o golpe militar que derrubou o governo de Jango, democraticamente eleito pelo povo brasileiro. Execuções, prisões, torturas, exílios, perseguições, foram consequências do arbítrio perpetrado pelos milicos que também puniram Zezito, tirando-lhe o emprego. O locutor não esmoreceu: buscou alternativas em São Paulo, mas não se adaptando à metrópole retorna à Ubatã, permanecendo outra temporada nesta cidade. A obra de construção da Usina do Funil tinha sido concluída e a euforia na economia local já não era a mesma. A necessidade impôs que Zezito Amaral continuasse caminhando.
Em 25 de setembro 1969 ele chega em Ipiaú. Instala a “Voz da Cidade”, reativando assim o serviço de alto falante que estava paralisado desde o fechamento da Voz de Rio Novo, empreendimento de Moacir Carvalho que tinha como locutor o vibrante Jota Hermano. Durante 34 anos, Zezito Amaral mostra seu valor prestando relevantes serviços à comunidade local. Acumulando a função de locutor com outras atividades sociais, Zezito se torna cada vez mais atuante: ingressa no Rotary Clube, molda-se ao perfil ipiauense, candidata-se a vereador pelo PDC, mostra seu espírito público, dá exemplos de cidadania. A sua paixão pelo futebol não deixaria de eclodir no Município Modelo. Organiza campeonatos, divulga eventos, promove espetáculos, dirige clubes.
Tanta contribuição lhe rendeu algumas homenagens, inclusive o nome de uma área de lazer e o da cabine de imprensa do Estádio Municipal. Na Rádio Educadora de Ipiaú realiza diariamente, das 14 às 17, um programa de variedades com grande audiência. No mesmo período lidera um movimento pela construção de rampas para cadeirantes e auxilia Dr. Roberto Nascimento, da Clinica São Roque, nas solenidades de doação de cadeiras de rodas às pessoas necessitadas. A entrega dos equipamentos acontecia, invariavelmente, no dia 16 de agosto, dedicado ao padroeiro da cidade. O vozeirão de Zezito Amaral tornou-se intimo da população que passou a lhe identificar pelo slogan: “O AMIGO DA CIDADE”.
Foi em Ipiaú que Zezito adquiriu sua primeira cadeira de rodas motorizada. Antes, ele sempre dependia de alguém para empurrar o veiculo. Quando era criança lhe conduziam num carrinho de mão, daqueles que antigamente utilizavam para carregos nas feiras livres. Depois foram as cadeiras de rodas convencionais, as quais eram empurradas por meninos contratados para o singular serviço. Alguns desses jovens absorveram os ensinos do inteligente cadeirante e se deram bem na vida.
O locutor Julio Souza, o mestre de capoeira Gideon Borges de Souza, hoje residente na Bélgica, o funcionário público Edvaldo de Souza Barreto, apelidado de “Fia Gasa”, o aposentado Humberto Barra e o jornalista Walmir Damasceno, dirigente do Instituto Latino Americano de Tradições Afro Bantu, constam desse elenco. Eles ficavam de prontidão, aguardando Zezito onde quer que estivesse. Aos domingos, o locutor tomava suas cervejinhas: corria freguesias, contava causos, rememorava fatos e quando estava “molhado” despencava a cabeça para o lado, curtindo o avançado estado daquela onda etílica. Era então que auxiliar de plantão entendia que estava na hora de levar o homem pra casa.
Zezito Amaral morreu no dia 27 de janeiro de 2004, em Ipiaú, aos 69 anos de idade. O serviço de alto falante que implantou passou a ser explorado pelo musico Clóvis Reis com a denominação de “Voz da Cidade Zezito Amaral”. Pelo tanto que fez em beneficio de Ipiaú, Zezito Amaral é merecedor de muitas homenagens. Colocar seu nome em uma das ruas de Ipiaú é um dever das autoridades do município, afinal era ele. “O AMIGO DA CIDADE”. (Giro/José Américo Castro).